E foi isto o que aconteceu!
Movido apenas por um sinal do meu companheiro divino, vi-me, de repente, na amplidão do infinito, atravessando as nuvens, subindo, sempre subindo. Uma alegria indescritível se apoderara de mim e, à proporção que ia subindo, sentia-me tão leve, tão diferente, que não pude deixar de fazer minha primeira pergunta:
Para onde me levas, anjo divino?
Vim buscar-te para o Céu! respondeu-me ele.
E por que estou ficando tão leve?
Então, explicou-me o anjo, o que se passava em mim:
Esta sensação que sentes é uma sensação de bem-estar, de alívio, de felicidade que sentem todos os que se aproximam do Céu. Como sabes, o Céu é o lugar que Deus reservou para as almas justas e santas, onde não há nem pode haver tristezas, sofrimentos ou contrariedades. O Céu é a própria felicidade, a alegria sem restrições dos que sempre desejaram o bem e a posse da eternidade com Deus.
É lá que tu moras?
Sim, moro no Céu. Sou dos querubins que estão sempre diante do trono de Deus, para servi-Lo e amá-Lo.
Então, sempre estás a ver Deus?
Sim, vejo Deus todos os dias. E quando tenho de afastar-me de sua presença, como agora, para o desempenho de alguma missão, sinto uma saudade imensa do meu lugar, porque ali a gente vive sempre feliz.
Pensei, então, que bom seria se Deus consentisse que eu ficasse no Céu. E que este sonho não fosse um sonho, mas a pura realidade!... Quanto mais voávamos, mais eu ficava transformado, sentindo algo diferente dentro de mim. Começava a ver os meus desejos satisfeitos e atendia a minha vontade. Via-me contente com tudo o que possuía e o mais interessante é que não desejava mais nada. E aquilo me trazia uma grande admiração, pois quantas coisas tenho ainda que fazer, negócios para resolver e, agora, tudo isso desaparece, por encanto, como se já estivesse realizado!
Num dado momento, o anjo olhou para mim e falou:
Estamos pertinho do Céu! Olha para baixo!
Olhei. A Terra me pareceu tão mesquinha, tão desprezível, tão sem atrações que fiquei admirado de me conformar em viver lá. Quis falar com o anjo, mas, quando olhei o seu rosto, fiquei espantado. O meu companheiro começava a transfigurar-se, ficando translúcido, tão lindo que fiquei abismado. Um sorriso divino, meigo e manso esboçava-se em seu rosto que parecia fitar alguma coisa lá muito distante. Não quis despertá-lo do seu êxtase e esperei que ele me falasse de novo, a fim de perguntar-lhe o que estava vendo. Por fim, comecei a ficar, também, transfigurado e pressenti que a velocidade do nosso vôo diminuía, como sinal de aproximação do Céu. Mais alguns instantes e encontramo-nos diante de um portão muito mais estreito do que o do Purgatório. Ao avistá-lo até pensei que por ele não pudéssemos passar e supus que se tratava de alguma ante-câmera do Céu. Depois que paramos, tive ânimo de perguntar ao anjo:
E agora, onde estamos?
Diante do portão do Céu! respondeu.
Assim, tão estreito?
E o anjo me explicou:
É que a entrada do Céu é muito difícil. O caminho é apertado e a portinha... bem que estás vendo!...
O anjo ajoelhou-se diante daquela porta esquisita, fez três reverências profundas e, aos poucos, ela abriu-se, deixando-nos ver o que estava lá dentro.
Meu Deus, que deslumbramento!
E, a um sinal do meu amigo, segui-o pelas belas alamedas da eternidade. Fomos andando, entre magníficos jardins de belas flores, sentindo o hálito perfumado daquele recanto esplendoroso, onde imperava uma beleza que ninguém pode descrever. Meu corpo se tornava cada vez mais leve. Por pouco, nem tocava mais no chão! Minha ansiedade era tão grande, que não pude deixar de perguntar ao anjo:
Isto aqui já é mesmo o Céu?
Sim, já estamos no Céu. respondeu o querubim. Mas o Céu tem muitos departamentos e agora é que estamos chegando ao primeiro degrau de felicidade.
E apontou-me para umas dependências muito lindas que íamos vendo e que, no sonho, não tinham portas e eram assim como se fosse de vidro, onde estavam as almas bem-aventuradas.
O anjo me foi mostrando aquelas mansões, cada uma mais deslumbrante, mais rica e mais cheia de encantamento. As pessoas que estavam lá dentro tinham uma fisionomia tão linda que fiquei confundido se eram anjos ou simples almas.
São almas, as almas puras. disse-me o anjo.
E continuou mostrando-me os diferentes degraus daquela felicidade:
Ali estão as almas humildes, lá adiante as almas obedientes e ali quero mostrar-te as almas das crianças.
Era um lugar maravilhoso, aureolado de luz, com anjinhos que iam e vinham, sorridentes e felizes. Umas estavam mais altas do que outras.
Por que? perguntei.
Aquelas mais altas estão mais perto de Deus. São as almas das crianças que, na Terra, respeitaram a Igreja, onde está a Eucaristia.
Aproximei-me um instante e pude ver a felicidade daquelas almas deslumbradas de luz pela suave magia da presença de Deus. E, como eu estivesse muito admirado, explicou-me o meu companheiro, o seguinte:
Na Terra, a Igreja é o lugar mais santo. É a casa de Deus por excelência, onde se realizam os atos litúrgicos em homenagem à Santíssima Trindade. A Santa Missa é o Sacrifício da Nova Lei, ao qual estão obrigados a assistir todos o que desejam salvar-se.
Atalhei o amigo, dizendo:
Sei disso, meu querubim. Esqueces que estás falando com um Sacerdote?
Não esqueci que és padre. Apenas quero chegar ao ponto seguinte: as crianças que se comportam bem na Igreja, respeitando a presença de Jesus Cristo, na Eucaristia, são aqui largamente recompensadas. Deus vem visitá-las duas vezes por dia e manda sempre seus anjos para ficarem com elas. Não vistes aquelas crianças que estavam rindo e conversando na Igreja, domingo, à hora em que celebravas a Santa Missa? Pois bem, crianças assim não merecem os favores de Deus, porque estão desprezando a sua casa e a sua presença. Crianças que assim procedem na Terra, ficarão muito tempo no Purgatório, antes de virem para o Céu.
Rapidamente meu pensamento voltou-se para a Terra. E, imediatamente, fiz o propósito de iniciar a minha pregação sobre o comportamento na Igreja, logo que voltasse ao mundo. Porque, se as crianças que são pequenas sofrem, no Purgatório, pela falta de respeito na Igreja, que sofrimento não estará reservado aos adultos?
E continuei meu passeio pelo Céu, olhando a beleza divina da morada dos santos, seguindo a indicação que me fazia o anjo. Estava deslumbrado com tanta felicidade e apesar de estar ali, apenas em sonho, sentia-me tão feliz que fiquei admirado quando o anjo me disse que já fazia um mês que estávamos no Paraíso.
É tão grande a felicidade que Deus reserva às suas almas que nem tomamos conhecimento do tempo. Aqui se vive a plenitude do que é bom, sem notar que já faz mais de um mês que deixamos a Terra!
Isso tudo? perguntei. Parece que foi neste instante que chegamos.
E, ansiosamente, temendo que já estivesse na hora de regressar, perguntei, aflito:
E já vamos voltar?
Não. respondeu o anjo. Ainda ficarás aqui por vários dias, porque tenho uma surpresa para ti.
Qual é?
Terás a grande alegria de falar com Deus.
Ouvindo estas palavras, meu coração estremeceu de contentamento. Falar com Deus. Tantas vezes, na Terra, invocara o seu Nome sagrado, e, agora, ia vê-Lo, face a face!
Quero mostrar-te também os teus santos protetores e a beleza do lugar onde eles moram. Olha para trás e vê a grande distância que nos separa do portão de entrada.
Foi então que percebi que há muitos dias ali estávamos, pois, no sonho, eu via o portão tão longe, tão distante, sumindo-se, pequenino, entre as nuvens douradas da pátria celeste. E, por uma intuição divina, percebia que tal distância só se podia andar, no Céu, dentro de muitos dias.
O anjo levou-me pelas galerias do Céu, ornamentadas com tapeçarias de raro valor, por onde anjos passavam, sempre calmos, mas com a fisionomia de quem ia fazer alguma coisa. Quando passavam por nós, faziam profunda reverência e continuavam seu caminho.
Para onde é que eles vão? perguntei.
São anjos, mensageiros de Deus, que vão à Terra para o cumprimento de alguma missão, assim como eu estou cumprindo a minha.
E por que fazem uma reverência quando passam por ti?
Por mim, não. Quando passam por ti respondeu o celestial amigo. Bem sabes que o Sacerdote tem grandes poderes no mundo e, no Céu, eles então, imediatamente, juntos de Deus.
E, para meu espanto, afirmou:
Sabes de uma coisa? Se um anjo encontrasse, aqui, um Sacerdote e Nossa Senhora, saudaria, primeiro, ao Sacerdote, para depois saudar à Mãe de Deus!
Foi, então, que um calafrio percorreu a minha espinha.
Meu Deus, em que situação estou colocado? Chamado por Deus para o desempenho de uma grande missão. Morar no Céu, junto ao Onipotente e ser saudado primeiro do que Nossa Senhora!
E onde estão as almas dos padres?
O anjo baixou a cabeça, tristemente, e respondeu:
Infelizmente, não poderás vê-las. A grandeza do padre, no Céu, compara-se à grandeza do próprio Deus. Tenho ordens do Onipotente para mostrar-te o lugar que eles ocupam, no Inferno, quando são condenados.
Fiquei assombrado com aquela notícia e perguntei:
E daqui vamos ao Inferno?
Não. Daqui não poderemos passar para o Inferno. Verás a condenação eterna de outra vez.
Então, ainda irás buscar-me para o Inferno?
Foi esta a ordem que recebi.
E, apesar de toda aquela felicidade, da mística alegria que antes invadira o meu coração, comecei a chorar. Ir ao Inferno para ver o lugar onde sofrem as almas dos Sacerdotes que não se salvaram!...
Mas o anjo consolou-me, dizendo:
Não te preocupes. São poucos os que se condenam.
Tu, por certo, estarás salvo. Não vês a predileção que Deus te dá? Protege as tuas obras, ajuda-te, inspira-te bons pensamentos, tudo isso por causa da tua devoção ao divino Espírito Santo.
Aquelas palavras do anjo caíram em mim assim como um bálsamo em ferida magoada. E meu semblante encheu-se de luz, enquanto continuávamos nossa visita pelos paramos celestiais de bem-aventurança.
Estamos diante dos aposentos dos teus santos de estimação. Não podes entrar porque ainda não morrestes. Mas verás os teus protetores, através das paredes de vidro que cercam a mansão dos santos.
E, descerrando uma grande cortina de veludo vermelho, apresentou-me os meus amigos celestiais que, na Terra, são tão invocados por mim.
No sonho, aquele recanto se me afigurava como um imenso campo coberto de mil flores, embaladas pelas carícias da brisa, como se toda a beleza do mundo, isto é, do Céu, ali tivesse sido posta pela mão misteriosa do próprio Deus. Minha alegria chegou ao auge, quando divisei a primeira fisionomia conhecida – Santa Maria Goretti! Lá estava ela. Olhando-me, esboçou um sorriso tão lindo que não pude deixar de exclamar:
Mas, que beleza... que indizível felicidade naquele rosto!...
Disse-me o anjo:
No Céu, os que morrem em defesa de sua pureza trazem sempre sorriso no rosto. Até Deus gosta de contemplar as almas que vivem aqui, por causa de sua pureza!
São Luís de Gonzaga, o patrono do Colégio que eu dirijo na Terra. São Francisco de Assis, o pobre. São Francisco que foi humilde e amigo da Natureza. Ali eu o via beijando a irmã água e contemplando a irmã lua. Santo Antônio, falando aos peixinhos do mar. Santa Teresinha, abraçando o seu crucifixo. São Domingos Sávio, bradando ao mundo que é melhor morrer do que pecar. Agora é que vejo porque ele dizia isso.
E minha admiração continuava e iria muito adiante, se eu não tivesse sido abordado pelo anjo, que me perguntou:
Queres ver o lugar dos papas?
Quero, sim! respondi.
E fomos caminhando pelos gloriosos caminhos do Céu, até, chegarmos diante de uma monumental basílica, assim como a Basílica de São Pedro, em Roma. Uma grande porta se abriu, enquanto belos anjos se apresentavam a nós, perguntando-nos o que desejávamos:
Ver os papas santos respondemos.
Mostra-nos o último que aqui chegou! disse o meu companheiro, dirigindo-se a um colega.
E, fazendo uma grande reverência a mim, o guardião da morada celestial dos papas, disse-nos:
Acompanhai-me!
E fomos andando. Os três, em silêncio. O último papa devia ser Pio X. Tinha vontade de perguntar, mas controlei-me e esperei. Quando fomos introduzidos no recinto dos Santos Padres, o anjo que nos acompanhava tomou de uma trombeta de ouro e tocou uma bela música.
Que significa isso? perguntei ao meu amigo.
Aqui, cada papa atende por uma música diferente. Cada um tem o seu toque de chamada.
E quem é que ele está chamando?
Espere e verás.
E qual não foi a minha surpresa quando, abrindo-se uma cortina de nuvens suaves e macias, apareceu diante de nós o Santo Padre, o Papa João Paulo I. Não resisti de emoção e cai, de joelhos, diante dele. Foi um momento de grande alegria. Fazia pouco tempo que eu havia assistido, na Terra ao seu enterro. Havia rezado diante de seu corpo exposto na Basílica de São Pedro e, agora, eu o tinha ali, junto de mim, podendo até tocar-lhe a batina branca como a própria pureza.
Mas aquilo tudo se passou muito rapidamente e deveríamos continuar nossa visita até a mansão divina onde morava o próprio Deus.
O anjo preparou o meu espírito, dizendo-me que eu ia ter a imensa felicidade, que só é dada às almas bem-aventuradas. E que, se eu tivesse algum pedido a fazer, fosse logo me preparando, porque diante de Deus só se podia falar muito pouco. No Céu não se fala. As almas se inter-compreendem por meio de um dom especial que lhes é concedido. Isso faz parte da felicidade eterna. Entretanto eu ia poder falar pelo simples motivo de ainda não ter morrido e estar ali como simples visitante.
Enquanto íamos caminhando, pisando num tapete de nuvens, concatenava meus pensamentos para fazer um pedido ao meu Criador. Mas, meu coração pulava tanto e uma ansiedade esquisita me apertava tanto a alma, que nem podia acertar com as palavras que eu haveria de dizer, quando estivesse diante de Deus. Por fim, paramos em frente a uma entrada defendida por vários anjos enfeitados de luz. Quando nos viram, ajoelharam-se todos.
Estes são os anjos que velam a presença eterna de Deus disse-me o querubim que me acompanhava.
E, apontando para um lugar vazio, entre eles, continuou:
Vês aquele lugar desocupado?
Vejo-o, sim.
Pois é o meu lugar. Dali saí, chamado por Deus, para trazer-te ao Céu, neste sonho, assim como te levei ao Purgatório, na semana passada.
Enquanto contemplava aquela imensa legião de anjos, vestidos com grandes túnicas, trazendo espadas de ouro flamejante nas mãos, todos de joelhos diante de nós, continuou o meu companheiro:
Nós aqui só nos ajoelhamos diante dos Sacerdotes e diante de Nossa Senhora.
E diante de Deus? perguntei.
Sim, diante de Deus, estamos todos de joelhos. Agora, dá sinal para que se levantem.
E, a um pequeno sinal que fiz com a mão, todos se levantaram.
Isso me deixava, cada vez mais, impressionado. Os Sacerdotes, no Céu, são tão reverenciados quase como o próprio Deus.
E agora, prepara-te para entrar! disse-me o anjo.
Com o coração ofegante e a alma transbordada de emoção, entrei nos aposentos sagrados de Deus Onipotente, o Criador do mundo.
Atônito, deslumbrado, fiquei caído diante da Majestade Divina, sem poder olhar direito aquele resplendor que me cercava de luz. Imóvel, sereno e sem mesmo bater os olhos, ali me deixei ficar, naquele silêncio feliz e tranqüilo que me fazia um bem imenso. Face a face, diante do meu Deus, vislumbrava o grande mistério da Santíssima Trindade, vendo ao mesmo tempo o Pai Eterno, o Filho Jesus Cristo, aquele de quem eu me tornara um representante e o Espírito Santo, inspirador dos meus bons pensamentos. E, enquanto os via assim, em três pessoas distintas, contemplava-as, por uma misteriosa intuição divina, como um só único Deus. Embevecido, maravilhado com aquela visão que eu nunca poderia descrever, perdi a noção do tempo, sentindo uma felicidade que não posso explicar em que consistia, pois era sentida, vivida por mim e não vista! Esqueci-me de tudo o que se passara antes, e até de mim próprio extasiado diante do meu Senhor. E só despertei desta entrega de mim próprio à felicidade que me inundava de satisfação e me enchia de amor, porque o meu companheiro celestial tocou, de leve, em meu ombro, fazendo-me compreender que estava na hora de sair. E, segredando-me ao ouvido, disse:
Faz um ano que estás aqui. Deves retornar à Terra para continuares o teu trabalho junto às almas que te foram confiadas.
E, numa pergunta meio aflita:
Já disseste o que tinhas a dizer?
Não, respondi. Ainda posso falar?
Podes, sim. Aproveita que vou esperar por ti aqui fora.
E retirou-se o anjo, sempre de joelhos, indo colocar-se no seu lugar, junto aos outros querubins e serafins assistentes de Deus.
Foi, então, que recebi uma graça especial e tive coragem de falar.
Meu Senhor e meu Deus! exclamei.
E uma voz maviosa como sussurro de brisa, tão terna, tão meiga que me encheu de coragem para continuar, respondeu:
Fala, servo bom e fiel!
Que doces palavras saídas da boca de Deus. Como me sentia feliz e animado naquela hora que eu desejaria nunca terminasse. Podia compreender, muito bem, toda a satisfação do Apóstolo São Pedro, quando pediu a Jesus para permanecer no monte da transfiguração, propondo-se fazer três tendas, três casas, para Jesus, Moisés e Elias.
Se eu pudesse, também, nunca sairia da presença de Deus e ficaria sempre a escutar a beleza divina de suas palavras de carinho, alentando-me a fazer o meu pedido.
Meu Senhor e meu Deus! continuei. Venho para Vos fazer um único pedido. Venho com a alma cheia de súplica, implorar de Vossa misericórdia perdão para os meus pecados. Se não sou um Sacerdote de acordo com o que deseja o Vosso coração, perdoai-me, Senhor, e ensinai-me a viver como desejais.
E aquela mesma voz suave e terna, deixou-me a brandura deste consolo, enchendo-me de indizível comoção e felicidade:
Sim, meu filho. Teus pecados serão perdoados, na medida do teu arrependimento. Receberás a graça deste arrependimento.
E, parando um instante, deixou que eu experimentasse daquela divina promessa. Por fim, voltou a falar.
Que mais desejas? Pede em nome de Jesus Cristo, de quem tu és um representante!
E pedi. Pedi aquilo que eu julgava imprescindível para o equilíbrio do mundo e para a subsistência da sociedade. Pedi, animado para receber, em nome de Jesus Cristo, o meu Senhor e Mestre. Pedi assim:
Ó Deus Onipotente, já que tenho a ventura de Vos poder falar, peço-Vos uma grande coisa. Suplico-Vos que não Vos esqueçais das mães de todo o mundo. Das mães que me pedem para rezar por elas. Das mães que não sabem ser mães. Das mães que não cuidam de seus filhos. Das mães que escandalizam os filhos. Das mães que desrespeitam a maternidade. Das mães que não são verdadeiras mães. Das mães...
Ia eu assim entusiasmado, fazendo o meu grande e importante pedido a Deus, quando o anjo tocou no meu ombro, dizendo-me:
Deus tem outras coisas para resolver. Já faz mais de um ano que estás aqui, diante dele. Chegou a hora de regressares à Terra. E, mesmo, Deus não poderá atender a todos os seus pedidos sobre as mães. O mais necessário seria que elas, lá na Terra, empregassem os meios para conseguir a salvação. Mas, se não se convertem, se não procuram a Deus, não O podem encontrar. Bom seria se voltasse à Terra e tratasse de prepará-las com tuas pregações, para a grande missão da maternidade, para a sublime vocação de poder dar santos ao mundo.
E puxando-me, de pé:
Ergue-te, vamos, não vês que Deus não está mais aqui?
Verdade, sim. Deus não estava mais ali. E eu a querer continuar falando, pedindo, insistindo. Puro egoísmo de minha parte. Aproveitando-me da oportunidade para querer tudo de uma só vez. Sim, Deus não estava mais ali e fiquei sem saber como Ele havia recebido este outro meu pedido.
Acompanhei o meu guia até o portão de saída do Céu e ali me despedi, perguntando-lhe:
Virás ainda buscar-me para visitar o Inferno?
Sim, foi esta ordem que recebi de Deus.
Estremeci de susto.
E quando será?
BREVEMENTE! exclamou o mensageiro divino.
Nesta hora, despertei e sentei-me, imediatamente, na cama. Meu Deus, que teria sido isso? Um pesadelo? Um simples sonho? Um aviso de Deus?
Enquanto me preparava para celebrar a Santa Missa, pensava, unicamente, na resposta do anjo, avisando-me de que, brevemente, levar-me-ia a visitar o Inferno.
E pedi, com toda a alma, a Deus que me livrasse deste outro sonho!...
Comentário: O Céu
É dogma de fé de nossa Santa Igreja que as almas dos justos que no instante da morte se acham livres de toda culpa e pena do pecado entrem no Céu. O Céu, ensina-nos a Mãe Igreja, é um lugar e estado de perfeita felicidade sobrenatural, a qual tem sua razão de ser na visão de Deus e no perfeito amor a Deus que dela resulta.
O coração humano é uma exigência de felicidade e todos nós temos uma nostalgia, uma saudade imensa do Paraíso perdido. Quantas vezes não sentimos uma saudade forte e não sabemos bem de quê. É do Céu, pois Deus nos criou para a Vida Eterna, para a Felicidade Eterna. A Sagrada Escritura registra a verdade sobre a imortalidade da alma (Salmo 48, 16; 72, 26; Daniel 12, 2; II Macabeus 6, 26; 7, 29.36). A Bíblia fala da ressurreição em muitas passagens e condena a superstição reencarnacionista, pois só temos essa vida aqui na Terra, vindo depois a Eternidade (Hebreus 9, 27).
O livro de Sabedoria nos descreve a felicidade e a paz das almas dos justos, que descansam nas mãos de Deus e vivem eternamente com Ele (Sabedoria 3, 1-9; 5, 15-16). Nosso Senhor representa a felicidade do Céu sob a imagem de um banquete de casamento (Mateus 25, 10; 22, 1ss; Lucas 14, 15ss) designado esta bem-aventurança de vida ou vida eterna (Mateus 19, 19; 25, 46; João 3, 15ss; 4, 14; 5, 24; 6, 35-39; 10, 28; 12, 25; 17, 2). A condição para alcançar a vida eterna é conhecer a Deus e a Cristo (João 17, 3). Aos puros de coração, Cristo promete que verão a Deus (Mateus 5, 8).
Nada na Terra pode ser comparado à beleza e à felicidade do Céu, embora a beleza e a felicidade aqui neste mundo, seja uma pálida imagem da realidade do Céu. Leia-se as palavras do Apóstolo São Paulo, que foi arrebatado até o Céu (I Coríntios 2, 9; II Coríntios 12, 4). Aos fiéis que perseverarem até o fim está garantida uma recompensa da vida eterna (Romanos 2, 7; 6, 22s) e uma glória que não tem proporção com os sofrimentos deste mundo (Romanos 8, 18). Em lugar do conhecimento imperfeito de Deus que possuíamos aqui nesta vida, então veremos a Deus imediatamente (I Coríntios 13, 12; II Coríntios 5, 7).
Uma idéia fundamental da teologia de São João é que pela fé em Jesus, Messias e Filho de Deus, consegue-se a vida eterna (João 3, 16.36; 20, 31; I João 5, 13). A vida eterna consiste na visão imediata de Deus (I João 3, 2). O livro do Apocalipse nos descreve a felicidade dos bem-aventurados que se acham na presença de Deus e do Cordeiro, isto é, Cristo glorificado. Todos os males físicos desaparecerão (Apocalipse 7, 9-17; 21, 3-7).
No Céu, os que permanecerem na fé verdadeira, também serão extraordinariamente felizes, pois estarão na companhia de Cristo (no tocante a Sua humanidade), da Virgem Santíssima, dos anjos, dos santos e voltarão a reunir-se com os seres queridos, familiares e amigos, que tiveram durante a vida terrena e conhecerem as obras de Deus.
Diz-nos, ainda, o dogma de nossa fé católica, que a felicidade do Céu dura por toda a eternidade. Nosso Senhor compara a recompensa pelas boas obras aos tesouros guardados no Céu, o que não se podem perder (Mateus 6, 20; Lucas 12, 33; 16, 9). Os justos, diz a Sagrada Escritura, irão para vida eterna (Mateus 25,46; 19,29; Romanos 2, 7; João 3, 15s). São Paulo fala da eterna bem-aventurança empregando a imagem de uma coroa incorruptível (I Coríntios 9, 25). São Pedro, nosso primeiro Papa, a chama de coroa imperecível de glória (I Pedro 5, 4).
O Céu é o cumprimento de todos os desejos legítimos e análogos ao estado futuro do homem (Salmo 16, 15). Para o provar, bastam estes dois princípios: primeiramente, o Céu é o livramento completo do mal e o gozo completo da pura felicidade sem fim; em segundo lugar, o homem será, no Céu, verdadeiro homem, isto é, em corpo e alma. O Céu será pois, a felicidade completíssima do corpo e da alma. Assim nos ensina a Santa Mãe Igreja baseada na Sagrada Escritura, na tradição e a nossa razão, o nosso coração diz amém! O Céu é uma exigência fundamental do coração humano.
Eis, pois, a razão porque o homem deseja o Céu com todas as forças do seu ser. Criado para a felicidade, gravita incessante e irrestivelmente para o seu fim, como a agulha tocada com o ímã para o pólo, e como tudo na natureza para o seu centro. Desde o berço até o túmulo, este ser abatido e desgraçado busca a sua reabilitação e o livramento do mal; este rei destronado busca o seu trono; busca-o por toda a parte, lembrando-se do Céu. Lamentavelmente, o homem sem a estrela, a bússola que o conduz ao Céu, a Igreja Católica, na sua procura de felicidade coloca-a onde ela não está e essa é uma terrível conseqüência de sua degradação. Dir-se-ia uma grande criança que, colocada na margem de sereno lago, vê de súbito no espelho das águas a imagem da lua. Toma-a pelo próprio astro, e no seu erro, precipita-se no lago, e a imagem de despedaça; e quanto mais se agita para a apanhar, menos a alcança. E o que resulta dos seus penosos esforços é a fadiga, o desespero, a morte no meio das águas. É o homem a buscar a seus pés o que está acima dele, perseguindo a sombra e não a realidade. Seu coração deseja felicidade, o Céu, mas o homem sem a razão iluminada pela fé segue o instinto e como pecador abraça a sombra dos prazeres da carne e erra o alvo; ao invés do Céu e da liberdade, encontra o Inferno, a escravidão. Diácono Francisco Almeida Araújo
Fonte: www.universocatolico.com.br
Autor: