por Pe. Gerardus Rusak
No dia 26 de junho do ano 2000, as autoridades do Vaticano finalmente revelaram, a pedido do Santo Padre o Terceiro Segredo de Fátima. Agora nós podemos vê-lo! Todavia, ao mesmo tempo que o revelaram, eles nos apresentaram uma interpretação bastante duvidosa no mesmo documento que tem como propósito apresentar o Segredo. Felizmente esses pobres manipuladores acabaram por deixar evidências suficientes para que pudéssemos descobrir sua falsa interpretação bem como o motivo de tal procedimento. Procuraremos agora dar uma breve examinada nesse documento , bem como no próprio texto do segredo.
O Documento preparado pela Congregação para a Doutrina da Fé traz as assinaturas do Cardeal Joseph Ratzinger e do Arcebispo Tarcisio Bertone S.D.B., respectivamente prefeito e secretário da Congregação, mas curiosamente não traz a assinatura do Santo Padre. Ao longo de 40 páginas é feita uma introdução pelo Arcebispo Bertone; a primeira e a segunda parte do "segredo" e uma tradução; a carta de João Paulo II à Irmã Lúcia, datada de 19 de abril do ano 2000; um sumário da conversa que houve entre Irmã Lúcia e o Bispo Serafim de Souza Ferreira e Silva de Leiria-Fátima no Mosteiro Carmelita de Coimbra, Portugal; as palavras do Secretário de Estado do Vaticano, Cardeal Angelo Sodano no final da cerimônia de beatificação dos pastorzinhos Jacinta e Francisco no dia 13 de maio, 2000, seguidos por um comentário teológico feito pelo Cardeal Ratzinger.
O Documento Romano começa com uma declaração do Arcebispo Bertone, que dá a essência da falsa interpretação do segredo: "Depois dos acontecimentos dramáticos e cruéis do século XX, um dos mais tormentosos da história do homem, com o ponto culminante no cruento atentado ao « doce Cristo na terra », abre-se assim o véu sobre uma realidade que faz história...". Para os modernistas a mensagem de Fátima é algo que pertence ao passado. Bertone afirma de forma escancarada "A decisão tomada pelo Santo Padre João Paulo II de tornar pública a terceira parte do « segredo » de Fátima encerra um pedaço de história, marcado por trágicas veleidades humanas de poder e de iniquidade...". Mais à frente, no mesmo documento o Cardeal Sodano dá respaldo, todavia de modo mais prudente, ao mesmo erro. Depois de falar da "queda" do comunismo em 1986, ele declara: "Embora os acontecimentos a que faz referência a terceira parte do « segredo » de Fátima pareçam pertencer já ao passado, o apelo à conversão e à penitência, manifestado por Nossa Senhora ao início do século vinte, conserva ainda hoje uma estimulante actualidade". O Cardeal Ratzinger torna a citar o Cardeal Sodano em seu Comentário teológico e endossa a mesma opinião.
Esses hábeis manipuladores souberam muito bem como se auto protegerem em suas falsas interpretações. Para isso chegaram até mesmo a utilizar a seu favor a autoridade de uma entrevista com Irmã Lúcia, a única dos videntes de Fátima que ainda continua viva. Mas especialmente aqui eles acabaram por tropeçar ao revelar a partir da entrevista com a religiosa, o suficente para desacreditar suas interpretações. Isso se dá justamente quando eles dizem que ela aprova tal interpretação. Afinal, o que Irmã Lúcia teria dito realmente em sua entrevista ao Arcebispo Bertone no dia 27 de abril de 2000? Podemos apenas ficar no campo das conjecturas já que o documento nos dá pouquíssimas pistas através das raras citações a respeito. A maioria das frases diz simplesmente: "A Irmã Lúcia concorda com a interpretação segundo a qual a terceira parte do « segredo » consiste numa visão profética, comparável às da história sagrada... A irmã Lúcia reafirma a sua convicção de que a visão de Fátima se refere sobretudo à luta do comunismo ateu contra a Igreja e os cristãos... "Mas no restante, o que a Irmã Lúcia realmente disse é mantido "em segredo". Por que será?
Todavia, uma inocente frase pode revelar muita coisa. Ao ser perguntada por que ela escreveu no envelope que o segredo só poderia ser aberto depois de 1960, Irmã Lúcia responde: « Não foi Nossa Senhora; fui eu que meti a data de 1960 porque, segundo intuição minha, antes de 1960 não se perceberia, compreender-se-ia somente depois. Agora pode-se compreender melhor. Eu escrevi o que vi; não compete a mim a interpretação, mas ao Papa ». Pois bem, aqui Irmã Lúcia do alto de seus 93 anos de sabedoria passa a perna nos diplomatas do Vaticano que querem que ela aprove a interpretação que eles dão ao segredo. Na verdade, o segredo é mais do que claro e para qualquer um que está consciente da presente crise na Igreja, ele é muito fácil de ser interpretado. Eis aí o motivo para toda essa "manipulação" ou camuflagem. Irmã Lúcia deve ter percebido isso e encontrou um prudente modo de dizer a nós e aos fabricantes dessa falsa interpretação, que embora ela contenha alguns pontos de verdade, ela não traz aquilo que é o óbvio, ou seja: "o Terceiro Segredo não é algo que diz respeito ao passado, mas sim ao presente e ao futuro".
Passemos então a considerar o texto do segredo em si. À primeira vista ele pode parecer desconcertante para alguns que tinham idéias pré-concebidas a seu respeito e pelo fato dele trazer uma visão profética e simbólica. Essa impressão diminui depois de uma segunda leitura. Vamos seguir a ordem do texto de Irmã Lúcia escrito no dia 3 de janeiro de 1944 em Tuy para o Bispo de Leiria, Portugal. Ela começa a explicar o segredo:
"Depois das duas partes que já expus, vimos ao lado esquerdo de Nossa Senhora um pouco mais alto um Anjo com uma espada de fogo na mão esquerda; ao cintilar, despedia chamas que parecia iam incendiar o mundo; mas apagavam-se com o contacto do brilho que da mão direita expedia Nossa Senhora ao seu encontro: O Anjo apontando com a mão direita para a terra, com voz forte disse: Penitência, Penitência, Penitência ! "
O Cardeal Ratzinger declara em seu comentário: "O anjo com a espada de fogo à esquerda da Mãe de Deus lembra imagens análogas do Apocalipse: ele representa a ameaça do juízo que pende sobre o mundo. A possibilidade que este acabe reduzido a cinzas num mar de chamas, hoje já não aparece de forma alguma como pura fantasia: o próprio homem preparou, com suas invenções, a espada de fogo". Tal declaração manifesta uma certa falta de fé da sua parte. Ele fala como se Deus não tivesse o poder de reduzir o mundo em cinzas sem o uso de bombas atômicas! Certamente é verdade que esse segredo poderia ser melhor compreendido por volta de 1960 quando mais do que nunca era necessário oração e penitência já que pairava sobre o mundo o perigo de uma guerra nuclear. Já bem antes de 1960, por algum tempo o homem já tinha começado a mudar seu estilo de vida, tentando fazer desse mundo seu próprio paraíso, idolatrando as criaturas e o conforto ao invés de adorar e servir seu Criador e atraindo sobre si a ira de Deus. Não temos dúvidas que a intercessão e intervenção de Nossa Senhora pelo mundo conseguiu atenuar esses castigos. Basta darmos uma olhada no panorama mundial por volta dos anos 60. João XXIII estava errado quando disse que o Segredo não dizia respeito ao seu pontificado. Claro que também dizia!
"E vimos n'uma luz imensa que é Deus: "algo semelhante a como se vêem as pessoas n'um espelho quando lhe passam por diante" um Bispo vestido de Branco "tivemos o pressentimento de que era o Santo Padre".
Com o "novo advento" do Concílio Vaticano II, a Igreja entrou num mundo distorcido a partir da década de 60 . Num espelho, as imagens são o reverso da realidade. O próprio Santo Padre não é facilmente identificável na medida em que ele abre as janelas da Igreja para o ar poluído do mundo. "Tivemos o pressentimento de que era o Santo Padre", mas a linhagem dos Papas a partir de João XXIII parece já não se identificar mais com a linhagem dos Papas do passado. Não resta dúvida de que o fato dos próprios videntes "não terem bem certeza de que se tratava ou não do Santo Padre, mostra que o Terceiro Segredo está centralizado nesses Papas e em suas vacilações em questões de Fé. Isso explica porque Irmã Lúcia teve grande dificuldade em transcrever a visão para o papel e os papas modernos em revelá-la.
"Varios outros Bispos, Sacerdotes, religiosos e religiosas subir uma escabrosa montanha, no cimo da qual estava uma grande Cruz de troncos toscos como se fôra de sobreiro com a casca;"
Seria um mero acaso o fato do texto apresentar uma estranha pontuação, fazendo com que a parte que fala em " Varios outros Bispos, Sacerdotes, religiosos e religiosas " venha primeiro, ( ao contrário da afirmação do Cardeal Ratzinger) precedendo o Santo Padre na subida da montanha? No topo da montanha está uma Cruz. Seria esse o símbolo do Santo Sacrifício da Missa? Tudo nos leva a crer que sim, já que a Cruz simboliza o Sacrifício Supremo e o Sacrifício Supremo da Igreja é a Santa Missa. A Cruz da montanha é sem dúvida símbolo de grande tribulação, da verdadeira vida cristã e seu ensinamento. Curioso é que embora as crianças de Fátima não consigam reconhecer direito o Santo Padre, elas conseguem reconhecer os bispos, padres e religiosos. Provavelmente porque na visão do segredo, eles aparecem vestidos em seus hábitos eclesiásticos. Isso com certeza exclui muitos sacerdotes e religiosos modernistas pós-Vaticano II dessa procissão de subida à montanha, já que até para qualquer pessoa da atualidade eles se tornaram irreconhecíveis: vestem-se e comportam-se como qualquer mundano.
"...o Santo Padre, antes de chegar aí, atravessou uma grande cidade meia em ruínas, e meio trémulo com andar vacilante, acabrunhado de dôr e pena, ia orando pelas almas dos cadáveres que encontrava pelo caminho..."
Esses são os ponto-chaves para a compreensão do segredo e da Igreja hoje. Mas aqui o Cardeal Ratzinger prefere dizer: "O que conta é a visão como um todo, e a partir do conjunto das imagens é que se devem compreender os detalhes". De fato, ele explica essa passagem de um modo poético e desliza sobre ela muito rapidamente: "A montanha e a cidade simbolizam o lugar da história humana: a história como árdua subida para o alto, a história como lugar da criatividade e convivência humana e simultaneamente de destruições pelas quais o homem aniquila a obra do seu próprio trabalho". Na realidade, a "grande cidade meia em ruínas" a qual o Papa atravessa antes de chegar ao cimo da montanha nada mais é que a própria Igreja depois da revolução modernista. O Papa " meio trêmulo com andar vacilante, acabrunhado de dôr e pena", nos indica uma série de Papas liberais, vacilantes, temerosos do que o mundo possa dizer. Sua dor e pena, bem como as orações "pelas almas dos cadáveres que encontrava pelo caminho"; marcam o início de seu retorno à Cruz e à verdadeira Fé.
"...tendo chegado ao cimo do monte, prostrado de joelhos aos pés da grande Cruz foi morto por um grupo de soldados que lhe dispararam varios tiros e setas..."
A interpretação do Documento Romano falha em ver que isso está muito longe de ser a tentativa de assassinato do Papa João Paulo II. Observem bem que é especialmente quando o Papa se prostra de joelhos diante da Cruz que ele é perseguido e morto tanto fisicamente ( balas- arma material do homem moderno) como subjetivamente através do ultraje público e oposição contra seus ensinamentos ( flechas- idéias, símbolo das antigas armas). Sempre que o Papado nesses tempos modernos tentar fazer qualquer coisa de verdadeiramente Católico ele será obstacularizado e neutralizado. O grupo de soldados e o material tôsco com o qual é feita a Cruz também não são sem significado. Soldados, especialmente em grupos, são agentes de alguma autoridade organizada e isso nos traz a idéia de uma perseguição bem organizada e bem orquestrada. O Papa diante da cruz tôsca de madeira e não diante de algum belo crucifixo em alguma bonita Igreja. Será que isso significa que os Católicos, inclusive o Papa serão expulsos de suas Igrejas e que terão que esconder-se nas catacumbas para sobreviverem? Parece-nos que essa parte do segredo diz mais respeito ao futuro do que ao passado ou presente.
"...e assim mesmo foram morrendo uns atrás dos outros , os Bispos Sacerdotes, religiosos e religiosas e varias pessoas seculares, cavalheiros e senhoras de varias classes e posições. Sob os dois braços da Cruz estavam dois Anjos cada um com um regador de cristal em a mão, n'êles recolhiam o sangue dos Martires e com êle regavam as almas que se aproximavam de Deus..."
E então o sangue dos mártires ( espirituais e físicos), que serão agradáveis a Deus, trarão finalmente o triunfo do Imaculado Coração de Maria. Muitos já derramaram o seu sangue nesse século XX. Muitos mais o derramarão no século XXI.
"E no final" , Nossa Senhora prometeu-nos: "O Meu Imaculado Coração triunfará. O Santo Padre consagrar-me-á a Rússia, que se converterá, e será concedido ao mundo algum tempo de paz".
O Documento do Vaticano afirma que essa Consagração foi cumprida no dia 25 de Março de 1984. Todavia a Consagração feita naquele dia em lugar nenhum faz menção à Rússia que está muito longe de ter se convertido. A Rússia de fato, tem se tornado cada dia mais materialista, consumida por um novo tipo de materialismo vindo do Ocidente. Portanto confrontando a situação com as palavras de Nossa Senhora, vemos que a verdadeira Consagração não foi feita, apesar de todas alegações em contrário. Se tivermos algum período de paz, essa será a "paz e segurança" do Anticristo predita por São Paulo na Carta aos Tessalonicenses. Essa falsa paz é o cenário preparado para uma nova geração de mártires profetizada no Terceiro Segredo de Fátima.
Terminando, agradecemos a Nossa Senhora e ao Papa João Paulo II por terem tornado possível a revelação desse luminoso Terceiro Segredo. Vamos rezar agora para que o próprio Papa receba a graça de interpretá-lo.
Padre Gerardus Rusak
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